
Novidades brasileiras 1y533
Aproveitando uma rápida visita à feira Wine South America, em Bento Gonçalves - RS foi possível provar que temos boas novas para trazer entre os vinhos aqui produzidos. Embora realizada no epicentro da atividade vitivinícola nacional, na Serra Gaúcha, a Wine South America é uma feira dedicada a vinhos de todo o mundo; um dos principais pavilhões, por exemplo, era das vinícolas italianas (muitas delas em busca de importadores por aqui). Além disso, os sempre presentes portugueses, chilenos e argentinos também ofereceram dezenas de rótulos para se conhecer e provar. 45606
A localização, claro, favorece a presença das vinícolas brasileiras e ainda que a maioria ainda esteja concentrando os esforços na busca de vinhos concentrados e com boa dose de carvalho para domar esta potência, especialmente nos tintos, existem projetos e linhas que valorizam a expressão da fruta. Veja, valorizar a fruta não implica em ignorar o uso dos barris de carvalho, mas usá-los de forma consciente, para valorizar a personalidade de um vinho. Afinal, um vinho também não precisa ser sem madeira, de fermentação espontânea ou biodinâmico para ser bom, não é?
Digressões à parte, vamos ao que interessa. Comecemos pela Serra Catarinense. Um dos pioneiros por lá, a Quinta da Neve nasceu em 1999 e vive um novo momento, com novos sócios. Na degustação com a enóloga Betina de Bem, destaque para o tinto Quinta da Neve Leão Baio, um corte de montepulciano, merlot, malbec e touriga nacional. Com generosa intensidade de frutas negras, encontra amparo na ótima acidez e álcool comportado (13%). Posicionado na faixa dos R$ 100 é um ótimo tinto que não pede muitos protocolos ou ocasiões especiais para ser bebido.
Thera, Quinta da Neve e Vivalti
Próximo da Quinta da Neve, também em São Joaquim, está a Vivalti Vinícola. O projeto nasceu em 2015 e saiu ao mercado em 2019. Os vinhos são assinados pelo competente enólogo Átila Zavarize. Nas taças, destaque para o Vivalti Pinot Noir 2022, repleto de notas de flores e folhas secas, fruta vermelha fresca delicada mas taninos e acidez firmes, que dão seriedade ao conjunto; e para o Macerado 2022, um Alvarinho macerado com as cascas por 45 dias, inspirado no o de Anselmo Mendes (com quem já trabalhou). O mesmo enólogo também comanda a produção da vinícola Thera. Ali brilhou o espumante Thera Auguri Blanc de Blanc Extra-Brut, 100% chardonnay e ciclo de 24 meses “sur lie”. Limpo, delicado, com borbulhas finas, traz elegantes notas de panificação (suspiro e massa amanteigada) sem ofuscar a fruta fresca (pera e cítricos).
Pizzato e Cordilheira de Sant’Anna
Partindo para o território gaúcho, a Pizzato é um bom exemplo da divagação inicial sobre o impacto mais consciente da madeira no vinho. Pizzato Chardonnay Legno 2023, chardonnay barricado (12 meses) e com malolática. A cada nova safra o vinho mostra sua ótima fruta em detrimento das especiarias e “peso" da madeira. Nesta safra 2023, traz abacaxi, maça e caju frescos no primeiro plano, com leve cremosidade e toques de marzipã e creme de confeiteiro no final. Um conjunto que ainda deve ganhar complexidade e integração na garrafa mas já se mostra bem fácil de se beber. Ainda no capítulo chardonnay, uma das vinícolas mais tradicionais da Campanha, apresentou o belo Cordilheira de Sant’Anna Chardonnay 2020. Não se assuste, pois a vinícola lança seus vinhos ao mercado com alguma idade e neste caso foi ótimo. Integrado e contido, com fruta madura (maçã e abacaxi), giz e toques lácteos no nariz, tem delicada untuosidade e ótimo frescor como complementos.
Entre os espumantes, vale conhecer a jovem vinícola Berkano, que trabalha com uvas do Vale dos Vinhedos e de Pinto Bandeira. O projeto tem dentre os sócios o enólogo Felipe Abarzúa, filho de Carlos Abarzúa - enólogo da Cave Geisse. Os três espumantes da linha tradicional da vinícola mostram ótimo equilíbrio, com destaque para o Berkano Cuvée Nature, feito com 80% chardonnay e 20% pinot noir (uvas de Pinto Bandeira) e ciclo de 18 meses com as leveduras após a segunda fermentação (na garrafa). Espere por ótimo frescor, com borbulhas finas e intensas, toque salino e nariz dominado por cítricos, flores brancas, maçã fresca, amêndoa e suspiro. Para os aventureiros, o espumante Viapiana 367 Dias Nature é feito com chardonnay, viognier e riesling itálico e traz os cítricos como protagonistas. Lima, limão, folha de cítricos dão o tom, com acidez firme e toques de frutas de caroço frescas e fermento cru.
Para tintófilos, começamos com Cristofoli Sangiovese Vendemmia d’Artista 2022 (Faria Lemos-RS). O quarto rótulo da vinícola feito com a variedade toscana (trabalham com a sangiovese desde 2012). O vinho fermentou e estagiou em barricas de carvalho por seis meses e depois repousou dois anos nas garrafas. A típica cereja vermelha que marca a variedade está presente, assim como a boa acidez e taninos finos em boa quantidade. No final as especiarias (cravo e baunilha) aparecem, assim como um toque de castanha assada, e aportam complexidade. São apenas 300 garrafas lançadas.
Fora da feira, mas ainda falando de boas novidades produzidas no Brasil, a vinícola Guaspari, uma das pioneiras na Serra da Mantiqueira, lançou o tinto Guaspari Porcellino Tinto 2024 (inspirada na obra de Piero Tacca - a vinícola hospeda uma das 24 réplicas existentes, como a exposta no mercado de Florença). Conhecida pelos syrah intensos e opulentos entre os tintos, o Porcellino trilha uma outra rota: é também uma varietal de syrah (diferentes parcelas de vinhedo) mas que não a por barricas de carvalho e leva 30% de cachos inteiros na vinificação. Na prática significa aromas mais florais (lavanda e violeta) e de ervas, o que reforça o frescor do conjunto e complementa a típica fruta negra da syrah. Na boca, destaque para os taninos, acetinados e firmes, que se prolongam na boca junto com a fruta. Trata-se de um vinho sério; com começo, meio e final.
Por fim, mas não menos importante, outro syrah de colheita de inverno, mas de Brasília-DF. Um dos projetos dentro do Grupo Vinícola Brasília é a Casa Vitor. O Casa Vitor Quatro Altitudes Syrah 2022. Seguindo no caminho do “menos é mais” o foco está na fruta, com nariz repleto de frutas negras, frescas e maduras, além do floral de violeta, igualmente exuberante. O nariz encanta pela intensidade e limpidez, seguindo para uma boca mais contida, com ótimo frescor e taninos finos, sem arestas. No final há um leve toque tostado (cacau) que casa bem com o perfil da syrah. Esta garrafa chegou até mim pelas mãos da amiga e jornalista brasiliense Adriana Nasser (@derolhaemrolha)